quinta-feira, 22 de outubro de 2009

A Noite é de Arte e de Bar

Uma hora da manhã de quinta-feira. No ambiente iluminado com luzes vermelhas e sob os olhares estáticos dos astros do rock n´roll estampados nas paredes, clássicos do reggae são ouvidos da rua. Nem cheio, nem vazio. As pessoas conversam descontraídas, com copos de cervejas artesanais em punho. Não olham à volta. Curtem o som ritmado que sai dos instrumentos tocados no palco. Todas as noites de quarta feira seguem o mesmo ritmo. As cortinas de luzes do palco se abrem para receber músicos diversos, conhecidos ou não, que sobem no tablado, pegam um instrumento e simplesmente tocam. Ali, naquele pequeno espaço, cada um é apenas um amante da música, um ser que se empolga e se emociona com cada nota que sai do instrumento que traz em mãos.

Mad tem os olhos fixos, completamente absorto em um mundo paralelo. Tem colada ao corpo uma guitarra e, apesar de estar no palco com mais dois músicos, sente o conjunto de sons como se estivesse só. Bruno Croda Machado, 22 anos, é um frequentador sistemático das quartas livres do Art & Bar, na zona norte de Porto Alegre. Conhecido como Mad por conta da semelhança com o personagem da revista americana de William Gaines e de Harvey Kurtzman, o jovem data sua história com a música de berço. “Toco na noite desde cedo, mas sempre estive muito em contato com a música. Já toquei de tudo. Estou sempre em busca de novas frequências sonoras. Por isso estou constantemente conhecendo novos instrumentos. Posso não saber tocá-los. Tu tem é que descobrir os sons”, conta o músico que trabalha com edição, sonoplastia de filmes e toca músicas do cantor John Mayer na noite de Porto Alegre.

Na mesma sintonia o mais jovem do palco não pára um instante de brincar com as baquetas enquanto as reveza com um copo de cerveja sempre abastecido por um amigo espectador. “Música é uma arte única, que transmite diferentes impressões e sentimentos”, afirma Bruno Braga Pereira, baterista conhecido como Metallica. O jovem de 21 anos toca na noite porto-alegrense desde 2006 com diversas bandas, faz faculdade de Música e praticamente vive de estudar bateria e correr atrás de cursos especializados com músicos renomados.

Entre as notas que remontam uma melodia conhecida, a voz de Marcelo Brum soa no microfone como se o próprio Bob Marley estivesse presente. O público canta junto. Aplaude. Vibra com a performance do grupo. “Música é esperança, união, trabalho, força, espiritualidade. Me sinto à vontade tocando, concentrado, naturalmente com personalidade”, conta o jovem de 23 anos apelidado de Rasta.

Os três músicos são amigos dentro e fora do palco. Cada um com sua trajetória musical em curso, todas elas cruzadas nas quartas-feiras. Mad é o único que cursa uma faculdade não ligada à música. O estudante de Publicidade tem suas jornadas musicais mais cansativas por conta do trabalho e da faculdade que leva durante o dia. Mas cansaço pra tocar, definitivamente, não existe. “Quando toco com meus amigos me sinto realmente amigo, pois tocamos há muito tempo juntos e é uma forma de comunicação, da amizade muito verdadeira. Se o clima estiver ruim, o som sai uma droga”, afirma. O artista diz não querer viver da música, mas sim de som.

Metallica e Rasta não compartilham do mesmo objetivo. Completamente submersos no mundo da música, os dois projetam um futuro ligado a shows e a tudo o que esse mundo primeiramente noturno tem a oferecer. “É na noite que tudo acontece”, explica Rasta, que toca profissionalmente na banda Brilho da Lata. Metallica conta que é músico nas noites de Porto Alegre pelo dinheiro e pela alegria de estar divertindo as pessoas e compartilhando esse momento com os colegas de banda. “Me sinto criativo tocando. Me sinto realmente bem.”

Entretanto, os três dividem mais uma paixão além da música: a cerveja. O copo sempre cheio, e a música no ar. Esse parece ser o cenário perfeito. Para quem os vê de longe, fora dos palcos, não são nada mais do que jovens comuns, curtindo sua festa. Porém, de perto, devidamente munidos de instrumentos, o profissionalismo se mistura às sensações boêmias dos bares e à efervescência da noite. Rasta afirma que a boemia faz parte de uma escolha de vida. Entretanto, todos concordam que a fama de boêmio faz parte da maioria dos músicos. Isso, definitivamente, não importa. O que fazem é o principal.

Já passa das três da manhã. Metallica desmonta a bateria e guarda os pratos na mochila. Mad despluga os pedais. O bar está praticamente vazio. Entre tchaus e até logos, os guris esvaziam os copos e rumam vagarosos pra casa. Os astros do rock n´roll na parede podem descansar sossegados. A música está segura nas mãos dos jovens músicos porto-alegrenses.