terça-feira, 3 de abril de 2012

Em busca de proteção para lecionar

Dificilmente há alguém que discorde que, para haver alto grau de eficácia na aprendizagem, uma boa relação entre professor e aluno deve ser estabelecida. Entretanto, diferente dos costumes de antigamente, que colocavam o professor como referência de conduta, provedor de todo o conhecimento e merecedor do respeito dos aprendizes, hoje se tornou comum, na mídia, a divulgação de situações de violência contra os docentes, seja esta moral ou até mesmo física. O estopim para essa mudança nas últimas gerações, ainda é um mistério. Contudo, diversos projetos de lei tramitam no governo buscando reconstruir as relações de respeito entre aluno e professor em sala de aula.

O projeto de lei (PL) 267/2011, da deputada Cida Borghetti do Partido Progressista do Paraná, (PP-PR) é um deles. Apresentado em fevereiro do ano passado, o PL estabelece punições para estudantes que desrespeitem professores ou violem regras éticas e de comportamento de instituições de ensino. A proposta muda o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei 8.069/90) e inclui o respeito aos códigos de ética e de conduta como responsabilidade e dever da criança e do adolescente que tem a condição de estudante. De acordo com conteúdo publicado no site da deputada, sobre os objetivos da proposta, o projeto poderia ser definido pela palavra “deveres”. “Não estamos falando em punição, e sim, em responsabilidades do aluno. Como há direitos, incluímos os deveres no caso de comportamento agressivo ou perturbador”, afirma Cida Borghetti em material divulgado no site. Para a psicanalista Adriana Bandeira, atuante em Montenegro, quando é necessário buscar auxílio de instância jurídica para determinar comportamentos de responsabilidade e de ética, é porque algo vai mal. “Não podemos deixar de apontar o grande sintoma social que representa, no sentido de tornar dever o que, de fato, estaria no campo do direito. É direito das pessoas tornarem-se cidadãos capazes de respeitar o outro, de fazerem-se aprendizes. Não por isso ou aquilo, mas porque o ser humano é, sempre, sujeito de aprendizagem. Se ela não acontece, há algo errado”, explica.

A educação é feita de relações

A professora de Artes, atuante no Ensino Médio e Fundamental, Tássia Renata Dörr comenta que o projeto está vindo em uma boa hora. “Não vejo mais aquela relação de respeito que havia antigamente. Hoje em dia o aluno não pede mais para ir ao banheiro, ele comunica que está indo. A pergunta se tornou outra porque eles sabem o que querem e falta limites. Então o professor agrega a tarefa de colocar o limite além de educar”, explica a docente de 26 anos. Tássia contabiliza apenas um episódio de problema com a conduta de aluno e reforça a necessidade do professor buscar se integrar na realidade vivida pelo jovem para estreitar laços de confiança e respeito. Ela explica ainda que situações de violência contra o professor sugerem a desconfiança de que o seu desempenho profissional possa estar indo na direção errada. “A gente é sozinho como professor. E quando acontece esse tipo de caso, a gente se cobra até que ponto estamos sendo bons professores. A gente chega num limite”, desabafa. Thais Gaia Schüler é professora de História do Ensino Médio, em Montenegro, e compartilha de muitas das opiniões de Tássia. Ela explica que as relações entre alunos e professores não devem ser pautadas pelo medo, como muito se via antigamente. “É importante buscar ter um bom relacionamento e ser um professor que está próximo da realidade daquele aluno”, afirma. Ela defende o papel dos pais em educar os filhos e darem o exemplo de uma conduta social apropriada. “Muito mais do que um aluno ser um problema, é o meio em que ele vive. Não é somente papel da escola educar. Todo mundo sabe dos seus direitos, mas esquece dos seus deveres”, comenta a jovem de 28 anos.

Em busca de medidas que protejam a docência

A psicanalista Adriana Bandeira explica que professores, enquanto seres da linguagem, buscam engendrar novas perspectivas e entendimentos que, quando não podem ser exercidos, se transformam em dor. “Neste sentido, um projeto de lei que venha transformar em dever o que é de direito, apenas tapa o sol com a peneira. Também é tapar o sol com a peneira as obrigações dispostas aos professores em que devem estudar, participar de cursos e serem agentes de inclusão, quando não são devidamente reconhecidos, remunerados, quando não lhes é disponibilizado tempo para tornarem-se, cada vez mais, agentes da paixão pelo desejo de aprender, principal bem humano.

De fato, leis que prevêem medidas punitivas para crianças e adolescente que não conseguem manter uma conduta aceitável em sala de aula, existem aos montes e, nem mesmo os professores chegam a tomar conhecimento da existência delas. Há um tempo, já tramita no Congresso Nacional o projeto de lei N° 6269/09 que criminaliza a agressão contra professores, dirigentes educacionais, orientadores e agentes administrativos de escolas. Dentro deste projeto de lei, a pena prevista é de quatro anos de detenção (em casos de agressão física) e de três anos (em caso de agressão moral). Outro exemplo é o projeto de lei do Senado 191/2009 que cria barreiras e punições contra alunos que cometerem agressões contra docentes. Esse PL foi aprovado pela Comissão de Educação e Cultura do Senado e não exclui as punições já previstas no Código Penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A grande dúvida que fica é o motivo de existirem tantos projetos e nenhuma lei, de fato, em vigor, que proteja o professor de violências. Uma boa resposta seria a demora para que esses projetos saiam do papel e se tornem, efetivamente, leis. Afinal, dos três projetos mencionados, um já foi arquivado e os outros dois continuam em análise pelo governo.

Projetos de Lei que visam a proteção do professor

PLS 191/2009: Estabelece procedimentos de socialização e de prestação jurisdicional e prevê medidas protetivas para os casos de violência contra o professor oriunda da relação de educação.
Apresentado em 12/05/2009
Situação atual: Matéria com a Relatoria da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH)

PL 6269/2009: Tipifica o crime de desacato ao educador mediante ato de agressão física e/ou moral no exercício da função ou em razão dela
Apresentado em 21/10/2009
Situação atual: Arquivada na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados (MESA)

PL 267/2011: Acrescenta o art. 53-A a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que "dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências", a fim de estabelecer deveres e responsabilidades à criança e ao adolescente estudante.
Apresentado em 08/02/2011
Situação atual: Aguardando Encaminhamento na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF)

FONTES: www.senado.gov.br ; www.camara.gov.br



* Matéria publicada no Jornal Ibiá (Montenegro - RS), em 30 de março de 2012.

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